terça-feira, 15 de dezembro de 2009

A garota mais sem graça que eu já conheci

Que ninguém se ofenda, pois não é essa a intenção. Amém.

Devia ter doze anos quando a conheci. Entrou na minha turma, na escola, no começo do ano, como qualquer pessoa. Ela não tinha apelido, como era de se esperar. Mais tarde, as amigas a chamavam pela primeira sílaba do nome, o que também era completamente previsível.

Ela passou pela escola sem maior dificuldade. Teve lá seus problemas: se não me engano não gostava de matemática, não ia muito bem em português e talvez não entendesse química direito. Ou física, não sei. Talvez as duas. Ficou de recuperação algumas vezes, outras não. Nada severamente preocupante. Não era, assim, uma das piores alunas - conversava na aula, mas não a ponto de se atrapalhar demais, ou se atrapalhar os outros. Com quem ela conversava eu não sei - provavelmente com quem sentava ali perto, faz mais sentido. Também nunca foi uma das melhores: se a professora sabia seu nome, não faço ideia do motivo. Não chamava a atenção, mas também não era necessário que chamassem a sua. Ninguém tinha por que reclamar dela, pois realmente não fazia nada.

Não direi que era feia - confesso que não fazia o meu tipo, mas talvez ela tivessa um namorado. Ou tivesse tido. Ou tenha tido, quem sabe até tenha agora. De qualquer forma, não era de todo mal, mas também não era bela a ponto de se destacar na multidão. Na formatura garanto que estava bonita, pelo simples fato de que TODA garota fica bonita na sua formatura. Quando não fica, é sinal de que há ali o que não tem salvação - mau gosto. Mas não falta de beleza, salvo casos berrantes. Aqui evidentemente não era um desses, pois se fosse seria fácil de lembrar. Agora que vejo, eu também não a vi berrar. Nem viria. Bem, não era apenas mais um rostinho bonito, mas não dava medo. Se não me falha a memória ela tinha um sorriso simpático. Talvez seja só minha imaginação, mas convenhamos que trata-se de algo plenamente plausível.

O fato é que ela nunca chamou atenção, nem para algo bom, nem para algo ruim. Jamais atraiu o gosto ou o desgosto. Não usava roupas estranhas, nunca lançou moda. Não passou gripe pra ninguém, não contou piada também. Todo esse tempo eu tinha certeza de que era uma pessoa que eu ia esquecer com facilidade, pelo simples fato de não ter o que guardar. Aconteceu de sairmos juntos no mesmo grupo, e provavelmente demos risadas das mesmas coisas, mas e daí? Poderia substituí-la por uma pessoa anônima genérica que daria na mesma. Quem era amigo dela? Umas amigas minhas. Mas quais eram as verdadeiras amigas, aquelas inseparáveis e tudo o mais? Não sei. Certamente havia alguém - prefiro acreditar que havia. Também nunca a vi bêbada; não que isso fosse parâmetro, mas vale acrescentar que ela não davaz esse tipo de vexame - na verdade, não lembro muito de tê-la visto em alguma festa ou semelhante, de qualquer forma.

Seu nome tinha um H? Não lembro. Acho que tinha acento. Hoje ela deve estar fazendo direito em alguma faculdade aleatória, ou cursinho, não sei. Mas certamente não era algo que me fizesse lembrar. Se fosse algum curso profundamente patético ou sem sentido, ou algo ousado, novo e desafiador, não teria como esquecer. Mas não, talvez fosse administração, quem sabe. Não faz muita diferença.

Talvez daqui a anos, décadas, nós nos encontremos. Um corredor de supermercado, uma fila de banco. "Olha, amor, eu acho que estudei com aquela ali. Só não lembro onde foi. Ah, deve ser conhecida de outro lugar. Ela é vizinha nossa?" - por outro lado, tenho uma ligeira impressão que posso demorar mais esquecer que vou esquecê-la: por incrível e ilógico que pareça, acabou por ser o exemplo insuperável (insuperado) de pessoa quase-interessantemente desinteressante. Não que ela realmente o fosse, creio que não era. Prefiro imaginar que não. Mas simplesmente não havia o que achar! Não se tratava de uma miss-teriosa, eram apenas detalhes (sequer segredos) que ninguém tinha vontade de saber.

Se algum dia alguém acabar por superar tamanha falta de... de je ne sais quoi, terei aí um sincero paradoxo: mais chato é quem é lembrado ou esquecido, tão chato que é?

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